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Recadoseglitters.com

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia....


A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e não ter outra vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo as luzes. E, á medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar café correndo porque esta  atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não da pra almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque esta  cansado.  Ao deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.
A gente se acostuma a abrir o jornal e ler sobre a guerra. E aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração. A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje eu não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.
A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a pagar mais do que as coisas valem. E a  saber  que cada vez vai pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com o que pagar nas filhas em que se cobra.
A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos. A gente se acostuma á poluição. Ás salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. Á luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Ás bactérias da água potável. Á contaminação da água do mar. Á lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo na madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta  do  pé,  a não ter sequer uma planta.
A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema esta cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho esta duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se o fim de semana não há  muito o que fazer, a gente vai dormir cedo e ainda satisfeito porque tem sempre sono atrasado.
A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma  para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.

3 comentários:

Paula Jácome disse...

Que texto lindo!
Eu não me acostumei... Moro em uma casa com mata atlântica no quintal, tenho um cachorrinho e hoje vi um canário amarelinho no meu jardim. Tenho tempo e adoro bater papo. Não me acostumo nem com minhas próprias crenças. Quero mudar o mundo!

Andrea Regazzo Medeiros disse...

Amei o texto!
Infelizmente nesse mundo maluco em que vivemos.. temos nos acostumado demais.. mas é ilusão dizer que, a gente se acostuma pra não sofrer...se a gente se acostuma para poupar a vida.. poupar de que?? de novos olhares,novas descobertas,novas percepções,novos sentimentos?Poupar o sofrimento mas e a alegria, o encantamento, a surpresa, a mágica, a beleza de tudo? Que não deixemos que a vida se gaste de tanto se acostumar para não se perder de sí mesma

Joakim Antonio disse...

E eu não sei porque a gente se acostuma tão fácil, palavras verdadeiras e que nos fazem pensar, eu me acostumei agora, a ficar muito mais tempo, fora do mundo virtual, mudanças forçadas me ajudaram, mas fui escrever à mão e pasme, praticamente a letra parecia de alguém aprendendo a escrever, agora estou escrevendo até em guardanapo, como antes. Há maus e bons costumes, devemos ver qual é melhor para nós e agregar mais do bom em nossa vida.

Parabéns pelo ótimo texto!